Um novo olhar sobre a participação nos lucros e resultados

As empresas utilizam diferentes alternativas para gerar maior engajamento dos

seus colaboradores com os resultados e objetivos estratégicos da organização.

Para os empregadores mais arrojados, “vestir a camisa” da empresa vai além de

entregar as tarefas do dia a dia, significa estar comprometido com o sucesso do negócio.

Neste contexto, as diferentes formas de remuneração variável são alternativas

que podem ser úteis para aumentar o engajamento dos colaboradores, atuar como

mecanismos para atração e retenção de talentos e, como consequência, impulsionar os

resultados da organização.

Para os colaboradores, sem demagogia, nada mais justo que a prosperidade dos

negócios reflita-se nos ganhos daqueles que trabalharam para isso.

Mas, antes de implantar qualquer forma de remuneração variável, além das

prévias análises financeiras que atestem a viabilidade da proposta, é imprescindível

estar atento aos meandros da legislação aplicável.

Afinal, não podemos nos esquecer da complexidade da legislação brasileira e da

litigiosidade pulsante que resulta no elevado nível de insegurança jurídica que

experimentamos em terras tupiniquins.

Bem-vindo ao Brasil!

E não fazemos referência aqui a nenhuma novidade.

A participação nos lucros ou resultados das empresas, desvinculada da

remuneração, tem previsão constitucional (art. 7º, XI da Constituição Federal de 1988) e

está regulamentada pela Lei n o 10.101, de 19 de dezembro de 2000, recentemente

alterada pela Lei n o 14.020, de 6 de julho de 2020.

A participação nos lucros ou resultados ou PLR não integra a remuneração dos

empregados, não é base para incidência de encargos trabalhistas (não tem reflexo nas

férias e no 13º salário, por exemplo) e, para esta parcela, não se aplica o princípio da

habitualidade (art. 3º da Lei 10.101, de 2000), de forma que os pagamentos a este título

não irão se incorporar à remuneração dos colaboradores, desde que atendidos os

requisitos legais para tal enquadramento remunerativo.

Instituída a PLR, a empresa não está necessariamente obrigada a renovar os

acordos para manter os pagamentos nos períodos subsequentes.

Entretanto, note-se que legisladores e juristas não se ocupam da gestão de

pessoas ou do clima organizacional e, uma vez implementada a participação nos lucros

e resultados, os impactos negativos da decisão de não renovar os acordos que a

instituíram devem ser cuidadosamente avaliados em cada organização.

Sobre a PLR não incidem contribuições previdenciárias (alínea “j”, § 9º, art. 28

da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991) e, do ponto de vista dos colaboradores, a

retenção do Imposto de Renda (IR) é mais amigável, aplicando-se a tabela anexa à Lei

10.101, de 2000.

As empresas optantes pelo lucro real poderão deduzir como despesa operacional

as participações atribuídas aos empregados nos lucros ou resultados, nos termos da Lei

e dentro do próprio exercício de sua constituição (§1º do art. 3º da Lei 10.101, de 2000).

Mas, para aproveitar as benesses mencionadas acima e evitar possíveis riscos

jurídicos associados a perdas financeiras, como autuações pelos órgãos fiscalizadores ou

demandas trabalhistas, é imprescindível seguir rigorosamente o script da Lei que

regulamenta a PLR.

Ainda, para que a PLR efetivamente funcione como ferramenta de gestão, ou

seja, para que a parcela retribua satisfatoriamente o esforço dos colaboradores, melhore

a atratividade da empresa e impulsione os resultados da organização, é preciso que

sejam adotadas práticas e procedimentos internos condizentes com estes objetivos.

A Lei que regulamenta a PLR, como instrumento de integração entre capital e

trabalho e como incentivo à produtividade, estabelece que a parcela deve ser objeto de

negociação entre a empresa e os colaboradores pelos seguintes procedimentos (art. 2º da

Lei n o 10.101, de 2000) que podem ser adotados simultaneamente:

comissão paritária de trabalhadores (composta por representantes eleitos por

trabalhadores e indicados pela empresa) e integrada por um representante

indicado pelo sindicato da respectiva categoria; ou

negociação coletiva (convenção ou acordo coletivo).

A implementação da PLR por convenção ou acordo coletivo segue os trâmites

previstos na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) para as negociações coletivas

(art. 611 e seguintes), tornando necessárias determinadas formalidades, como a prévia

submissão e aprovação do ajuste em assembleia de trabalhadores e registro da

convenção ou acordo coletivo no Ministério do Trabalho e da Previdência.

Como alternativa à negociação coletiva, a PLR pode ser instituída por comissão

paritária de empregados, integrada por um representante indicado pelo sindicato da

respectiva categoria (ou pelas respectivas Federações e, na falta desta, pelas

Confederações, em se tratando de categorias inorganizadas em sindicatos no âmbito de

suas representações).

Com as alterações introduzidas pela Lei nº 14.020, de 2020, a comissão de

empregados poderá concluir os trabalhos sem o representante da entidade sindical,

desde que o respectivo sindicato, cientificado por escrito, não indique seu representante

em até 10 dias, de forma que a ausência do representante sindical não é mais empecilho

para implementar a participação nos lucros ou resultados.

Aos integrantes da comissão de empregados, sejam os representantes dos

trabalhadores ou aqueles indicados pela empresa, não é assegurada estabilidade

provisória.

Os acordos relativos ao pagamento da PLR devem conter regras claras e

objetivas quanto ao direito ao recebimento da parcela, inclusive os mecanismos de

aferição das informações relativas ao que foi acordado pelos envolvidos, periodicidade

de distribuição, período de vigência e prazos para revisão do acordo, podendo ser

considerados, dentre outros, os seguintes critérios e condições (§1º do art. 2º da Lei n o

10.101, de 2000):

índices de produtividade, qualidade ou lucratividade da empresa; e

programas de metas, resultados e prazos, pactuados previamente.

É possível, por exemplo, estabelecer metas baseadas no aumento de market

share, na redução de despesas, na melhoria dos indicadores que medem a satisfação dos

clientes quanto aos produtos ou serviços prestados pelas empresas, dentre outras

medidas que sejam factíveis para as pessoas e que estejam alinhadas aos objetivos

estratégicos da organização.

Não há espaço aqui (e muito menos utilidade) para a excessiva complexidade no

estabelecimento das metas.

O acerto na definição das metas individuais e/ou coletivas é crucial para que o

acordo cumpra a finalidade a que se destina.

É necessário ter em mente que o pagamento da parcela é estritamente

condicionado ao atingimento das metas previamente pactuadas.

Do ponto de vista legal, o pagamento da participação nos lucros e resultados

dissociado do atingimento das metas levaria à desconsideração da natureza

indenizatória da parcela, atraindo riscos e repercussões financeiras para as empresas e,

do ponto de vista de gestão de pessoas, o acordo e as metas estabelecidas estariam

desacreditados pelos colaboradores.

Acrescente-se que, para que a PLR sirva aos propósitos de integrar capital e

trabalho e de incentivar a produtividade como idealizado na Lei que a regulamentou, a

transparência, a comunicação eficiente e a consistência no acompanhamento dos

resultados são práticas que precisam integrar o planejamento elaborado para

implementar a parcela.

E a cultura organizacional deve estar preparada para este movimento.

Além disso, o conhecimento prévio das metas pelos colaboradores é requisito

essencial para o sucesso na implementação da PLR.

A partir de 2020, a Lei n o 10.101, de 2000 considera que as regras terão sido

previamente estabelecidas desde que fixadas em instrumento assinado antes do

pagamento da antecipação do PLR, se for o caso, ou com antecedência de 90 dias do

pagamento da parcela única ou final, na hipótese de antecipação (§7º do art. 2º).

É proibido o pagamento de qualquer antecipação ou distribuição de valores a

título de PLR mais de 2 vezes no mesmo ano e em periodicidade inferior a 1 trimestre

(§2º do art. 3º da Lei n o 10.101, de 2000).

Quando da rescisão dos contratos de trabalho, por qualquer que seja o motivo,

todos que contribuíram para o atingimento das metas recebem a parcela de forma

proporcional, ainda que a rescisão contratual ocorra antes da data pactuada para

pagamento (Súmula 451 do Tribunal Superior do Trabalho).

Em sintonia com os novos tempos, cabe aqui adotar a política do ganha-ganha,

utilizando as melhores práticas para implantar a participação nos lucros e resultados,

objetivando elevar o patamar de desenvolvimento das empresas brasileiras.

Seria este mais um passo para nos aproximarmos da era do capitalismo de

stakeholders?